O Lado Positivo de um Confinamento Forçado



Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor!


Todos conhecemos os momentos difíceis que o mundo tem vindo a sentir. Mesmo quem não ande muito atento às noticias, sabe o que se passa, pois de uma forma mais ou menos intensa, teve de ou ainda tem de estar confinado (o maior tempo possível) às quatro paredes de sua casa.

No entanto, há quem consiga tirar partido dessa tão internacional e agora tão conhecida expressão: Lockdown.

Muitos são os passatempos que se desenvolvem, a criatividade tem vindo a aumentar, a alimentação está mais saudável, um ritmo mais calmo nas nossas vidas, em que as chamadas de vídeo são uma constante ainda maior. No meio descobrem-se novos talentos. E há quem ainda crie o seu próprio negócio. O Luso.eu foi falar com alguns emigrantes para perceber a que tipo de confinamento estão sujeitos e como se adaptaram à sua nova realidade.

Marta Dias, em Copenhaga não vê a família há um ano e apesar dos confinamentos e restrições terem porpocionado um natal muito diferente, conseguiu desenvolver os seu talentos. Há seis anos que não se dedicava ao hobby dos tempos de estudante de arquitectura: aquarelas. Também houve oportunidade para um novo projecto fotográfico em que fotografa "famílias portuguesas nas suas portas que viviam cá e passar um pouco a mensagem que não estamos sózinhos". Neste segundo confinamento, Marta decidiu dedicar-se mais aos estudos e o projeto ficou em standby.

Alexandra Anacleto, de Beja e a viver há 21 anos no Reino Unido, apesar de se manter bastante ocupada com o seu trabalho, conseguiu dedicar-se à cozinha nestes tempos de pandemia. "Arranjei tempo para fazer queijos frescos, pão de ervas e pão com chouriço" e o que inicialmente se apresentou como uma brincadeira, tem tido bastante sucesso e "as encomendas são muitas", confessa a emigrante portuguesa.

Na Suíça, apesar do confinamento não ser muito rígido, Debora Esteves, tem estado em teletrabalho desde Março de 2020. Quem agradece é a sua saúde, bem como a sua cadela que tem tido mais companhia. Debora, passou a adoptar um estilo de vida mais saudável, alterando a sua alimentação e a da sua companhia de 4 patas. Ajudando os produtores locais, a emigrante passou a consumir produtos alimentares direto dos agricultores da região e reduziu o consumo de hidratos de carbono. Confessou ao jornal também que tem utilizado o tempo extra do dia na costura, modalidade que tem aprendido sozinha. E descobriu a paixão pela cozinha "a minha irmã é que ficou contente quando fiz pela primeira vez broas de café e estou a aprofundar os talentos de culinária, preparando mais vezes comida tradicional portuguesa", revela a portuguesa. Os hobbies não ficam por aqui, já que Debora anda com a criatividade ao rubro: "Remodelei a casa umas 5 vezes desde Março de 2020, transformando algumas peças pelo caminho".

Em Bruxelas, na Bélgica, o marido de Vera Gomes decidiu pôr mãos à obra e começou a produzir a sua própria cerveja artesanal. Já a emigrante portuguesa, juntou-se aos seus "companheiros de luta" de Portugal e criaram uma associação para representar pessoas com doenças inflamatórias do intestino. "Temos mantido uma actividade profícua na informação e sensibilização para este tipo de doença e mantemo-nos muito activos no esclarecimentos para questões relativamentes à pandemia", refere Vera. Com mais de 4000 pessoas juntas numa comunidade online portuguesa que sofrem com estes problemas, Vera confessa "que não há espaço para outros hobbies".

"Bordei muito mais e nunca houve tantos bolos e bolachas nesta casa", são as palavras de Luísa Laranjo que está no Luxemburgo e aproveitou para adoptar uma cadela, bastante agradecida pelo tempo passado com os seus novos donos.

Na Alemanhatem sido a música  a revelar o lado positivo a Jacinta Pereira. "O que me tem ajudado é o contacto com os outros músicos do mundo. Tenho participado em workshops com maestros do Brasil, Chipre. Eu própria tenho dado alguns workshops online, coisa que nunca pensei que acontecesse".

Apesar da privação de parte da liberdade de cada um, Joana Jorge em tom de brincadeira admite que nunca se sentiu mais livre, quando descobriu que "o cabelo grisalho e caracolado me dá uma sensação melhor do que viver sempre a esticar e a pintá-lo", mas foi com o confinamento que aprendeu a fazer pão e paelhas. "Outra coisa muito engraçada é que temos ajudado uma prima virtualmente a distrair a filhota enquanto ela trabalha em casa, em Africa do Sul". No final, no entanto confesosu a falta que os seus pais fazem à sua família. Depois de terem ficados retidos em sua casa até Junho, a saudade aumentou significativamente: "que bom que temos internet… quem sabe em Abril…", espera a emigrante.

Brisbane, Austrália, não regista novos casos de COVID-19 há meses, mas no entanto a vida reduziu o seu ritmo e o teletrabalho foi algo que ficou. "Ainda não voltámos aos escritórios nem há qualquer pressão para o fazer. Os arredores de Brisbane estão cheios de vida de novo, pois o trabalhar a partir de casa permite tempo para tomar um café e isto dá que pensar", relata-nos Carin Pires.

O Reino Unido com mais de 100 mil mortes diárias causadas pela pandemia, tem apertado o cerco e muitos foram os países que fecharam as portas a este país com mais de 66 milhões de habitantes. Andreia Dias, uma portuguesa a viver no país dos Beatles, sente bastante falta da frequência com que viajava para Portugal. Confessou que no primeiro confinamento, em que toda a família ficou em casa, se sentia exausta e não conseguiu dar asas à imaginação. Neste último lockdown, como ficou sózinha, já conseguiu ter mais tempo para inventar: "devo ter feito um bolo por semana, ando a ler bastante sobre a educação montessoriana e a adaptar o quarto do miúdo para estas actividades e reintroduzi o exercício físico na minha vida". Apesar de como família acreditar ter sido de alguma forma benéfico, a nível pessoal sente-se "desmotivada, isolada e com muita falta de socializar".

A 23 de Fevereiro de 2020, o primeiro país da Europa isolava cidades inteiras, devido ao desabar do sistema de saúde italiano, provocado por uma pandemia global. Carla Gonçalves ficou em casa mais de 6 meses, um período que lhe revelou a paixão pela costura. Neste segundo confinamento, em que continua a poder trabalhar, a sua vida não tem mudado muito, mas aprendeu "a dar mais valor ao apoio familiar que tinha dos sogros e aos almoços de domingo com toda a família reunida à mesa".

O tempo recuperado que se perdia nas deslocações para o trabalho serviram também para reencontrar o seu eu. Paula Araújo acabou por achar revelador o tempo de confinamento. "Tive os meus baixo, mas os positivos pesaram mais: fiz uma viagem de autodescoberta sobre quem sou através da psicoanálise, voltei ao exercício físico, fiz muitos cursos para desenvolver novas técnicas e todas as refeições passaram a ser caseiras".

O teletrabalho tem sido uma realidade a que nem todos tiveram acesso. Os profissionais cujas tarefas são presenciais, como da insdústria alimentar, passaram inclusive a ter de estar mais tempo fora de casa, numa tradução de horas suplementares de trabalho. Enquanto uns se desesperam pela dificuldade de trabalhar com crianças em casa, outros falam em excesso de trabalho. Para alguns destes, o único lado positivo tem sido o financeiro "sem cortes de salário,pelo contrário", como é o caso de Lisa Brandão, emigrante na França, que desde o inicio da pandemia não teve tempo de desenvolver novos hobbies, nem descobrir novos talentos, apenas se questiona diariamente "quando é que isto acaba?".

Também os profissionais de saúde não têm a vida facilitada no momento. Cecilia Rodrigues, como enfermeira sempre teve de trabalhar e muito, e a maior dificuldade foi gerir quem cuidava da filha que não tinha escola presencial. O que mudou veio por consequência de pedidos da sua filha para mudar de profissão. "Comecei a tentar uma segunda coisa e sou representante de uma marca de robôs de cozinha, ainda estou a começar, mas alivia ter algo diferente da enfermagem", confessa.

Uma realidade diferente enfrenta Lia Espiguinha, que após um perído de confinamento de 3 meses em Espanha, com a sua filha e sem o marido, se viu forçada a outro mais duro no Panamá. "Eu cheguei ao Panamá dia 29 de Dezembro e no dia 1 de Janeiro começou o confinamento nacional; agora só podemos ir ao supermercado pelo nosso género sexual: segundas, quartas e sextas as mulheres", relata. "A única coisa boa é estarmos os três juntos, já que no ano passado estivemos 9 meses sem ver o meu marido. Mas se no primeiro confinamento dançei, fiz bolos, trabalhos manuais, neste só me apetece apanhar um barco e ir para uma ilha deserta", desabafa Lia.

Marisa Misa, teve de alterar a sua vida e regressou a casa, em Coimbra, devido ao estado de saúde do seu pai. Para ela, os tempos não têm sido fáceis, por viver com três pessoas de elevado risco. Assim, o medo de contágio e a pressão económica em ser por vezes o único sustento da casa, é uma constante. "Estamos a viver uma crise financeira mundial que tudo tem para agravar, enquanto vemos os nossos direitos diminuidos. O teletrabalho não é uma realidade bem fiscalizada e há formas para os patrões desviarem-se da lei. Enquanto que alguns podem passar mais tempo com os seus, outros não o podem fazer", desabafa a conimbricense. O cansaço e revolta sentem-se no discurso desta portuguesa que apela a que mesmo que se pense no bom que temos, se continue "a lutar por melhorar as condições de trabalho, para que o futuro não se mostre tão perigoso, com uma diminuição constante dos direitos profissionais, pessoais e de expressão".

Apesar de nem todos terem tido a possibilidade de parar um pouco no meio desta pandemia. Houve quem, tenha passado este tempo entre costuras, bordados, remodelações de casa, passando pelas pinturas à prática de mais exercício físico. A resiliência é sempre um fruto das dificuldades e isso tem-se notado na actualidade. O desenvolvimento de cada um pela veia artística seja ela no mundo das artes, seja ela na cozinha ou na costura. A possibilidade de gerir melhor o seu próprio tempo, fez com que a maior parte dos pais e mães portugueses tenham aproveitado mais os seus filhos. Tanto pelo exemplo de Inês Trancoso que aproveita a sua gravidez em pleno na Alemanha, bem como outros pais quer eles de bebés e crianças mais pequenas, num acompanhamento mais presencial do seu crescimento, quer de filhos mais velhos no apoio da sua vida escolar e familiar. Além de que nos intervalos, muitos têm sido os talentos descobertos num período que se tem mostrado complexo para tanta gente.

Isabel Gonçalves, teve de reformular o seu discurso para perceber a sorte que tem tido: "Passei a ter bolo feito pelo marido e filho todas as semanas, que posso viver com o meu marido 24/7 sem me chatear, a não desperdiçar tanta comida, a beber café sem açúcar, a dormir mais por não ter de me deslocar ao trabalho, a poder trabalhar de pijama, a ver a sorte que temos por ser uma época digital, aprendi a ser mais solidária e a pensar mais nos outros, porque nem eu nem o meu marido perdemos o trabalho e não nos afetou financeiramente". Em épocas contorbadas, "se nem tudo são flores, dê valor aos espinhos" – pensador Felipe Arco.  

Luso.eu - Jornal das comunidades
Carla Pimenta
Author: Carla PimentaEmail: This email address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it.
Para ver mais textos, por favor clique no nome do autor



Luso.eu | Jornal Notícias das Comunidades


A sua generosidade permite a publicação diária de notícias, artigos de opinião, crónicas e informação do interesse das comunidades portuguesas.