Clínicas privadas contestam APA e IGAMAOT: a imagiologia dentária não é um desastre nuclear



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Desde sempre, nas clínicas dentárias, a radiologia é regulada de forma exequível, desburocratizada e simples. Nos últimos meses, assistimos a uma autêntica caça às bruxas, por iniciativa da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento Território (IGAMAOT).

Porque terá sido a radiologia oral englobada no mesmo foco de fiscalização da agricultura e do mar, ou até do ordenamento do território? Que competências terá este organismo em protecção radiológica? O organismo refere: « O ano de 2020 traz à IGAMAOT novos e relevantes desafios decorrentes da sua designação como autoridade inspetiva em matéria de proteção radiológica (…), com a atribuição ex novo de funções sem antecedente ou histórico neste organismo ». Se a própria administração reconhece a invulgaridade desta nomeação, existirá um motivo lógico para o sucedido?

O IGAMAOT é um organismo da Administração Pública que, além do financiamento através do Orçamento de Estado, dispõe também de receitas provenientes de coimas aplicadas, processos de contra-ordenação e custas e juros. Daqui, poder-se-á extrapolar que existe um incentivo à “caça à multa”, considerando que o orçamento previsto para a sustentabilidade financeira do IGAMAOT depende em grande instância da aplicação de coimas. Mais concretamente, de 2.350.000,00 € de receitas próprias. Será legítimo assegurar a saúde financeira de um organismo da administração pública através desta via?

Com a chegada da Directiva Europeia 2013/59/Euratom, que introduziu alterações significativas em matéria de protecção radiológica, num assunto que pedia reflexão ponderada, aconselhamento jurídico e consulta de especialistas e profissionais da área da Saúde, para a aplicabilidade razoável da prática corrente às normativas, o Governo transpôs a mesma directiva, quase palavra por palavra, para o ordenamento jurídico nacional, em 2018. Na maioria dos países europeus, isto não só não se verificou com tamanha complexidade, como já havia estruturas de suporte para assegurar a normal aplicabilidade da Directiva.

Causará perplexidade o facto de alguns técnicos de empresas privadas de protecção radiológica terem sido contratados pelo IGAMAOT para a actividade de inspecção? Estarão a idoneidade e os conflitos de interesse devidamente acautelados?

Agora, existe obrigatoriedade de realizar consentimentos informados aquando da execução de qualquer tipo de radiografia, antes e até durante o tratamento. Estes consentimentos informados, que contêm dados pessoais e intransmissíveis dos utentes, são requisitados para consulta pelos técnicos de inspecção, pese apenas o facto de não haver qualquer parecer ou legitimidade para o efeito, ao abrigo do RGPD e do sigilo médico. Após uma análise exaustiva aos relatórios mensais de dosimetria de vários médicos dentistas, verificou-se que os valores reportados de radiação são nulos ou próximos de zero. Assim, introduzem-se burocracia e procedimentos legais numa área aparentemente sem necessidade para tal. Nos postos de controlo dos aeroportos, cuja emissão de radiação é francamente superior à de uma radiografia intraoral, estará prevista a realização de um consentimento informado?

Para o licenciamento e/ou verificação periódica dos aparelhos radiográficos, será necessária a intervenção de um físico médico, que em Portugal são cerca de dezasseis, para um universo de cinco mil clínicas dentárias, fora as outras clínicas. Portanto, foi transposta uma Directiva Europeia para a legislação nacional não existindo em número suficiente empresas de protecção radiológica certificadas para permitir aos prestadores o cumprimento das normativas, o que conduziu a uma desregulação absurda dos valores praticados por estas empresas às clínicas dentárias. Um licenciamento e verificação anual que poderia custar 300,00€ aumentou para muitos milhares de euros. Vários prestadores privados foram notificados pelo IGAMAOT com irregularidades nos relatórios de verificação periódica, alguns deles com parecer favorável das empresas de protecção radiológica, sob ameaça de contra-ordenações que podem ascender às centenas de milhares de euros.

Em pânico gritante, os médicos dentistas do sector privado não podem deixar de se questionar: será esta mais uma tentativa de esmagar os pequenos prestadores privados? Estes custos irão reflectir-se no valor das consultas e, por conseguinte, fragilizar ainda mais o acesso aos cuidados de saúde?

Será o exercício da Medicina Dentária o novo desastre nuclear do século XXI? Face à surpreendente possibilidade da cobrança de coimas astronómicas, não será financeiramente mais razoável encerrar os consultórios médicos? Estes valores são ajustáveis às situações de não cumprimento?

Pelos motivos expostos, a AIMD e a ANC apelam aos grupos parlamentares que seja colocado um requerimento parlamentar para suspensão e revisão do Decreto-Lei n.º 108/2018, sob pena de que, se tal reflexão com os prestadores de saúde e com as ordens profissionais não for aceite, estarão criadas as condições para o incumprimento legal e outro tipo de acções legais.




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