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As almas mais seniores dirão que era o mundo associativo que tornava mais fácil a aventura da emigração.  Exercitava-se o espírito de comunidade, de pertença, de acção colectiva.  Juntavam-se compatriotas em festas populares, jogos de cartas, ensaios de música, assembleias de bitaites. 

Os emigrantes escolhiam um grupo, um espírito grupal, e integravam-no, quer fossem estudantes, empresários, aprendizes de macramé ou praticantes de concertina.  O emigrante português abandonava as dificuldades em Portugal, comprometido com a missão de criar uma vida melhor.  Saía com poucos euros no bolso e a missão profunda de criar raízes lá fora.  Via-se no futuro uma promessa por cumprir e o associativismo contrabalançava a perda de tudo o que se deixava para trás.  Tudo para (já agora) fazer o sacrifício da mudança valer a pena. 

Hoje a emigração é um fenómeno mais fluído.  O jovem emigrante (ou “expat” / ou beneficiário de um gap-year) vem com as opções sempre abertas para voltar, ou de saltar para outro país.  Há oportunidades de emprego sempre “on display” no LinkedIn e as novidades da família estão sempre connosco no ecrã retangular que temos no bolso das calças.  Hoje, nenhum de nós sabe o que é ter de esperar por “notícias de Portugal”.  Emigramos com a habitação previamente escolhida no Immoweb, um estudo prévio no Google Maps e a linha de metro mais útil decorada.  Hoje, “visitar a terra” concretiza-se com um fim-de-semana prolongado graças aos voos low-cost.  Por isso, no momento de fazer as malas, não fechamos realmente um capítulo.  Afastamo-nos com um ‘até já’ ou ‘até um dia destes’.  Com o mundo sempre em vista e os planos B e C salvaguardados, é natural que os jovens sintam menos necessidade de apostar todas as suas fichas num destino final.  Se não fazemos isso com a carreira, por que haveríamos de o fazer com a residência?  Já não casamos com o nosso país de acolhimento.  Vamos para namorar e ver no que dá.  E já nada é para sempre: só até deixar de fazer sentido.

Nesta evolução de coisas, o fenómeno do “associativismo” – dos domingos em círculo, guitarra e imperiais, dos planos discutidos em voz alta e organizações escritas em papel – passou de necessidade material a mera poesia patriótica.  O mundo associativo perdeu membros, perdeu tamanho e perdeu força.  E é aqui que os grupos de Whatsapp entram em ação: para colmatar as angústias migratórias que, por mais que os anos passem, existem de uma forma ou de outra.

Já pouco se invoca o conceito de comunidade (e diáspora, sejamos francos, é um termo foneticamente infeliz).  Mas “grupo” – e dito assim casualmente – serve perfeitamente.  São muitos, há para todos os gostos e funções, e dispensam burocracias.  Um nome, o número de telemóvel do costume e um link de entrada são o que baste.  A adesão não implica compromisso, muito menos a promessa de envolvimento emocional.  A realidade é mais pragmática do que isso: entramos e estamos a ver o que por ali se passa.  Estamos a ver as vistas.

Queremos, naturalmente, ser receptor das novidades, não vá o melhor evento da época passar-nos ao lado.  Já para não falar de que ganhamos muitos destinatários para as nossas perguntas desesperadas de última hora.  Aí, sim, e com o espírito de solidariedade de alguns, é provável que chegue algures uma mensagem amiga com a dica que nos safa.  Depois, e em tempo de férias ou maior cansaço, há sempre a tentadora possibilidade de os silenciar a todos.

São estas grandes moradias virtuais do Whatsapp, com hóspedes ilimitados, que apoiam os novos emigrantes dos dias de hoje.  Não havendo taxa de inscrição, nem tão pouco compromisso obrigatório, percebe-se quem receba notificações de 25 grupos em simultâneo.  O Whatsapp aguenta tudo e a nossa adição ao ecrã, infelizmente, também.  Ganhámos uma grande quantidade de novas conexões, é verdade, mas não creio que tenhamos conquistado uma integração correspondente.  Vale até a pena perguntar se estas redes sociais não nos limitam a convivência pela superficialidade.  Emigramos menos corajosos, com um pé em cada lado, e a mente em todo o sítio.  Talvez o associativismo de outros tempos tenham dado lugar a fóruns de assistência personalizada abertos 24horas.  Se calhar, hoje, é isso que preferimos...

É isso que preferimos?

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