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Existe nos nossos tempos a fácil compulsão pela tentativa de assumir o presente como o início e o fim do que somos e até mesmo da extensão do que fomos enquanto coletivo cultural. 

Ou seja, vemos o presente como um decalque espelhado do passado e não admitimos que as mudanças do futuro possam ter respaldo num lastro ancestral que temos agarrados a nós tal como o ADN que nos está no sangue.

A forma de pensar e agir dos povos em confronto com os tumultos modernos obedece a um conjunto de regras não escritas, mas implícitas no ADN da história, por alguma razão os coletivos de nações reagem aos estímulos do mundo, como reagem. Nada é por acaso.

Quero escrever claro está da França e da sua história sucessiva de clivagens brutais e muitas vezes sangrentas, das divisões que ao longo da sua cronologia foram acontecendo na sua sociedade, das bifurcações ideológicas, das cisões com o pensamento, ou mesmo das ramificações religiosas. Tudo isto contribuiu para o sucessivo parcelamento de uma sociedade compostas por inúmeras personalidades fortes e antagónicas.

Esta introdução é importante para iniciar o tema, porque se olharmos a França desde a entrada para o projeto europeu sucessor da II Guerra Mundial, podemos esquecer que a sociedade francesa foi sempre dividida. O projeto europeu ajudou de certa forma a olharmos para a República Francesa como um pilar e não como um fator de instabilidade.

Mas a verdade é que quem inventou o conceito “esquerda VS direita” foram os franceses. Atualmente o perigo radica objetivamente da destruição declarada do centro moderado, remetendo para uma esquerda capturada pelo seu extremo, encabeçado por Melanchon e a direita igualmente saneada pelo seu extremo, personificado pela família Le Pen.

O contexto histórico no tempo longo, não causa nenhuma surpresa com a situação atual. Relembro o 24 de agosto de 1572, dia do massacre de São Bartolomeu que levou ao assassinato de 5mil a 30mil Huguenotes (depende das fontes) por parte da maioria católica. Uma guerra religiosa enorme e com consequências fundas na memória francesa.

As sucessivas Revoluções francesas e os seus episódios de deposição da monarquia, a tomada da bastilha, as decapitações das cabeças coroadas. Napoleão e a sua ambição pela conquista, a guilhotina e a atual “Praça da Concórdia”. Só um povo discordante entre si pode ter necessidade de criar um espaço com este nome sabendo que foi o palco do pior terror francês.

E por fim o orgulho ferido na guerra franco-prussiana, na I guerra mundial e a derrocada do exército na II guerra mundial em tão poucos dias que atirou a França para o regime de Vichy.

É preciso lembrar que nestes episódios que escolhi houve sempre fervorosos adeptos dos dois lados da barricada. Entre monárquicos e republicanos, católicos e protestantes, a favor do terror e contra o terror, por Vichy e contra Vichy, por De Gaulle e contra, pela Europa e contra. Tudo isto existiu em França e estas questões existem ainda com a roupagem dos dias de hoje.

Nada neste texto pretende normalizar o “Rassemblement national”, não existe nada que me faça ter simpatia por partidos que acicatam o medo, usam as pessoas e jogam com as dificuldades latentes da sociedade para ganhar poder ao invés de servir os cidadãos.

Mas é preciso ter consciência de que os coletivos culturais têm muita força e uma característica da nação francesa é esta divisão da sociedade é polos fortes e dispare.

 A Europa e os seus valores moderados estão a ser captados pelos seus inimigos mais ferozes que usam todos os instrumentos ao dispor para rasgar com o que conhecemos desde 1945.

É com muita pena pessoal que o país do lema “Liberté, Égalité, Fraternité” possa estar hoje captado por maioritariamente por políticos que enjeitam o mais basilar respeito pelos Direitos Humanos”.

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